Eduardo Alves Melo (Fiocruz)
Rosana Onocko Campos (Abrasco)

Neste relatório estão sintetizadas as exposições, os resultados dos grupos de trabalho com especialistas e as principais proposições do seminário “Financiamento do SUS: Equidade, Acesso e Qualidade”, ocorrido em 01 de setembro de 2023, na Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Fiocruz.

O financiamento público foi consensualmente compreendido como condição para os sistemas de saúde que visem à garantia de acesso universal, com equidade e qualidade. No Brasil, assim como na América Latina, a segmentação do acesso, com a coexistência de um forte setor privado, representa um dilema central para o fortalecimento do sistema de saúde.

Embora o gasto em saúde total tenha representado 9,4% do PIB em 2017, predomina o gasto privado no Brasil. Em perspectiva comparada, o país apresenta um dos piores patamares de gasto público em relação a um amplo conjunto de países selecionados. Os dados para os anos de 2000 e 2018 demonstram a manutenção da participação do gasto público em apenas 42%. Confira neste relatório.

Defendeu-se uma abordagem integrada do financiamento, considerando as funções de arrecadação, alocação e mecanismos de compra. A ampliação de recursos públicos é um requisito para uma melhor alocação do gasto em saúde, garantindo um financiamento estável e sustentável. O grau redistributivo dos gastos sociais e tributos foram evidenciados, com destaque para o setor saúde. Apesar deste cenário, evidenciou-se que o volume de recursos federais para o SUS foi reduzido no período entre 2018 e 2022.

Para a ampliação de recursos para o SUS, o Regime Fiscal Sustentável, sancionado dois dias antes do Seminário, suscitou grande preocupação, uma vez que mantém a condução da política de saúde vulnerável ao desempenho econômico. Em relação a este novo arcabouço fiscal, foram destacados pelos participantes: i) o novo marco regulatório é baseado no equilíbrio fiscal e não apresenta cláusulas de escape; ii) a expansão do gasto com políticas sociais fica dependente do crescimento de receitas e vulnerável a crises econômicas; iii) há restrições importantes quanto aos investimentos; e iv) as regras são complexas e pouco flexíveis.

Os argumentos enfatizaram a responsabilidade do governo federal para o incremento de recursos públicos para o SUS, tendo em vista o maior peso de sua competência para tributação e a receita disponível, mesmo após as transferências constitucionais – além do estrangulamento das contas dos entes subnacionais e o fato de a União ser a detentora dos instrumentos de política econômica.

Para uma melhor alocação de recursos no SUS, o governo federal deve ter a capacidade de olhar para o sistema de forma integrada, na perspectiva das redes de atenção, buscando corrigir iniquidades entre os territórios. A alocação de recursos deve ser norteada pelas necessidades de saúde identificadas em processo de planejamento ascendente e integrado.

Contudo, persistem distorções alocativas e aspectos que reduzem a transparência e dificultam o acompanhamento do gasto federal. Os valores empenhados em 2022 por emendas parlamentares representaram 9,7% do valor empenhado em ações e serviços públicos de saúde, superando 20% dos recursos transferidos aos entes subnacionais no âmbito da Atenção Primária à Saúde, sem que a alocação se submeta às diretrizes da Conferência Nacional de Saúde e ao processo de planejamento ascendente, em desacordo com o marco legal-normativo do SUS.

Por fim, defendeu-se que a diretriz constitucional da participação da comunidade no SUS no processo de planejamento e fiscalização da aplicação dos recursos seja respeitada e valorizada. O fortalecimento do SUS requer também medidas que reduzam a participação da oferta privada no consumo de saúde, com maior regulação do Estado e uma redução drástica de incentivos e subsídios ao setor privado.

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