“É preciso que o reconhecimento [da sociedade] seja motor de uma mobilização social em sua defesa para, por um lado, protegê-lo contra a adoção de medidas que o fragilizam e, por outro lado, implementar políticas e programas que o fortaleçam e aperfeiçoem”

Este capítulo apresenta e discute a política de saúde no Brasil no período de 2019 a meados de 2021, com foco nas medidas adotadas pela União, sem desconsiderar os seus aspectos federativos, o que implica tratar também do envolvimento dos estados, do Distrito Federal e dos municípios na sua implementação. Nesse período, a saúde ocupou o centro da agenda do governo e capturou as atenções da sociedade, tanto pelo início de uma nova gestão no governo federal, com a promoção de mudanças importantes em algumas áreas dessa política, quanto pela resposta governamental à pandemia de covid-19, que tensionou ainda mais o Sistema Único de Saúde (SUS). Esses fatores, por um lado, ressaltaram as dificuldades do SUS e, por outro lado, serviram para destacar a relevância desse sistema e seu caráter estratégico para o país. Ficou claro que a efetividade da resposta brasileira à pandemia dependeu fortemente do SUS e dos avanços obtidos em pouco mais de trinta anos desde a sua criação.

Em 2019, a nova gestão promoveu modificações significativas na Política Nacional de Atenção Básica, área que passou a ser denominada no Brasil de atenção primária à saúde (APS), e na Política Nacional de Saúde Mental (PNSM). Além disso, alterou a estrutura organizacional do Ministério da Saúde (MS) para atender às prioridades do governo que se iniciava. Pelo fato de a APS e a saúde mental terem sido as áreas priorizadas pelo Executivo federal, foram as que receberam maior atenção por parte das equipes técnicas do MS, desde o início da gestão, o que resultou em rápidas e profundas mudanças em sua organização e financiamento. O processo de acelerada reformulação de políticas de saúde parece ter sido apenas interrompido por causa da emergência do novo coronavírus, no final daquele ano, e da declaração de situação de emergência em saúde pública de importância nacional, em decorrência da pandemia de covid-19, no começo de 2020, a qual provocou um redirecionamento dos esforços do MS.

No curso de uma pandemia, de consequências tão graves quanto as ocasionadas pela de covid-19, é natural que a agenda pública seja dominada pelo tema. Mas, no caso do MS, o embate político fomentado pelo presidente da República em torno de algumas questões, como as reponsabilidades federativas pelas medidas de combate à pandemia, a adoção de medidas não farmacológicas para frear a transmissão do vírus, a recomendação para uso de medicamentos com eficácia não comprovada e, posteriormente, com ineficácia comprovada no tratamento precoce da covid-19, além das mensagens de desestímulo ao uso de vacinas anticovid e das repetidas mudanças de ministro e de seus auxiliares mais diretos, sequestrou a agenda da saúde e fez com que o trabalho do MS gravitasse em torno desses temas, com atuação muitas vezes contraditória. Com isso, na prática, a nova gestão no MS contou apenas com o primeiro ano de governo para promover alterações mais profundas em políticas e programas no âmbito do SUS, como se verá mais adiante.

Este capítulo aprofunda a discussão sobre essas questões, estando organizado em quatro seções, incluindo esta de apresentação. Na seção 2, discute-se a conjuntura da saúde no contexto da pandemia de covid-19, destacando-se questões como a regulação dos leitos de unidade de terapia intensiva (UTI), a disponibilidade e a gestão de recursos humanos, a demanda reprimida e a coordenação da atenção à saúde entre seus níveis e instâncias de governo durante a crise sanitária, além da demanda por reabilitação e cuidados de longo prazo em razão das sequelas causadas pela covid-19. Na seção 3, mostra-se o acompanhamento da política de saúde no período abrangido pelo capítulo em suas áreas mais relevantes, a saber, APS, atenção especializada, vigilância em saúde e assistência farmacêutica. Também se destaca um tema que ganhou bastante importância nesse período, a saúde digital.1 Além disso, apresenta-se a execução orçamentário-financeira do MS em 2019 e 2020, e discute-se a saúde suplementar, importante segmento do sistema de saúde brasileiro, e a regulação desse setor durante a pandemia. Por último, na seção 4, algumas considerações são feitas em termos de desafios e perspectivas futuras para a política de saúde no Brasil.

Baixe o relatório “Políticas social: acompanhamento e análise – 29 – Saúde

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